quinta-feira, 26 de maio de 2011

O Difícil Dia 27 de Maio: O Dia do Revanchismo

Temos a sensação de que quase todas as “grandes” mudanças em Angola, pós-independência, constituem um incompleto ajuste de contas com o passado, onde quem reivindica um presente “mais justo”, carrega consigo não só a suposta magoa de ser injustiçado, aldrabado e enganado. Mas também o sentimento de vingança e a foice da revanche. Esta, e o seu adjunto, sempre como mensageiras da morte.

Não acredito ser fácil descrever o sentimento de raiva e ódio das partes derrotas. Tanto a vingança como a revanche têm dentro de si a mensagem do revisionismo, que trás consigo uma mensagem de mudança assustadora e que nega um passado que não tem só a ver com as forças políticas que habitualmente formaram parte do cenário político angolano. É como se o homem angolano, independentemente de todos os partidos políticos e lideres, que aí existiram não merecesse consideração e atenção dentro da história do País e sua função devesse ser ignorada.


Até hoje não entendi a função de vários movimentos ou associações que levam o nome do dia acima supra mencionado, se é só para os esclarecimento das verdades ocultas por todas as partes, ou se o objetivo é fazer sentir o sabor amargo e azedo da vingança aos seus adversários políticos.

Uma coisa é certa, mesmo existindo uma lei sobre anistia, para os crimes do dia 27 de Maio essa lei não pode ser usada para se enterrar todos os mortos vítimas daquele dia; e se fazer justiça para aqueles que clamam pela mesma.


O malfadado Dia 27 de Maio, o dia que, desgraçadamente, poderíamos chamar do dia da revanche, divide o MPLA em dois grandes grupos. Nem vou usar aqui a expressão “angolanos”, porque nem todos angolanos têm a haver com a maldição desse dia. Em aqueles que dariam tudo, mas tudo mesmo, para não escutarem as reivindicações barulhentas. Esta parte é a composição do poder que hoje temos aí. A outra são os sobreviventes de uma herança golpista com a turma de abutres que, mesmo não participando nos eventos infelizes daquele dia, fazem coro em sincronia com às reclamações das vítimas. Não se precisa nem de esperteza para concluir que esta solidariedade só se justifica quando o objetivo é o sonho de destruição do poder que até hoje resiste a qualquer tipo de alternativa.

Na luta pela neutralização de seus inimigos e adversários, o homem primeiro precisa se agarrar as suas certezas. E errado pensarmos que está última palavra é sempre sinônimo de verdade. É a ciência da lógica que nos alerta que aquela, a certeza, pode estar muito distante do que é verdade. E não só, certezas podem ser a fossa de erros em que nos encontramos e insistimos estar por vários motivos, até mesmo para sobrevivermos aos golpes dos nossos inimigos e adversários.


O MPLA, e o poder aí existente, carrancudo e cínico – com relação ao 27 de Maio-, estão numa fossa de erros, quando insistem em ignorar este dia e os seus reivindicadores. Primeiro, porque torturas e execuções sumárias são crimes que nunca prescrevem e não existe anistia que os salve da justiça. Segundo, ignorar os gritos das diferentes organizações que defendem os direitos e reivindicações dos familiares das vítimas daquele dia, longe do que se quer e se imagina, é fomentar o ódio. Terceiro, uma comissão da verdade serve para restabelecer a verdade vinda de todas as partes e desmascarar mentiras criadas por gente oportunistas que fazem da democracia a fogueira da inquisição.

Sejamos sinceros, MPLA e Estado Angolano, erros existem e só em democracias autênticas eles poderão ser esclarecidos e, também, resolvidos. A persistência em estar naquela fossa de esgoto é o resultado de dois fatores: Primeiro, a falta de uma inteligência que ajude a concluir que a surdez descabida diante dos fatos do triste dia da revanche pode provocar desgastes políticos e sociais e ser ainda motivo para todo tipo de intriga e conspirações. Segundo, estar naquele lugar ajuda a manter o preconceito sobre a maneira como se estruturou e até hoje se estrutura o poder em Angola, alimentando precisamente esse sentimento de injustiça, propiciando o sentimento de desforra.


O próprio MPLA é um buraco de certezas absolutas em que os erros sempre vieram dos adversários. Ou seja, esse partido como conseqüência da falta da democratização interna nunca está disposto a discutir erros do passado. Também não era para menos, são os mesmos que há trinta e cinco anos governam o país, participaram em todas as contendas: desgraças e êxitos da nação. Mas isso não é motivo para hoje se aferrarem a um estilo de governação que não resiste aos novos tempos. Sem contar que crimes são crimes e devem ser esclarecidos a sociedade para que num futuro não se cometam os mesmos erros. E tem mais, o silêncio imposto indica que o mesmo é feito de uma parede e que atrás dela estão ocultadas muitas coisas a serem reveladas. As verdades do 27 de Maio são verdades que devem ser ditas à sociedade e ela é parte de um patrimônio: a justiça angolana e uma suposta comissão da verdade.


Só tem medo do passado quem tem dificuldades de se enquadrar no novo regime democrático em que as leis e as verdades ajudam a dissipar as desconfianças. Fala-se tanto das Instituições Democráticas, que são as que verdadeiramente mantêm o sistema de democracia; nenhuma instituição poderá estar a serviço da democracia se não tiver como tradição o cumprimento das leis e como hino o entoar e o evocar da verdade.

Verdades e leis são condições necessárias para apagar-se a imagem revanchista que este dia trás no calendário angolano.


Nelo de Carvalho
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