Comecei esse texto com muitas dúvidas, precisamente, por aparentar ser um tema polêmico. À medida que fui pensando sobre o mesmo descobri que a polêmica pode ser digerida e que vale a pena atiçar as consciências, fazer um chamado de atenção, ou então despertar as pessoas da ignorância. Em volta desta polêmica estão as empregadas domésticas e o trabalho doméstico. E a pergunta provocadora é: na luta de classe –esta luta também consiste em nos livrarmos das seqüelas do colonialismo e da escravidão- quem sairá beneficiado com o trabalho doméstico de milhares de mulheres angolanas ou, talvez, milhões?
E, para não perder o fio da meada, aquela luta não consiste simplesmente na expulsão do colonialismo português. Aquela luta deve passar, também, por necessidade e obrigação moral, política e econômica, pelo êxito de transformarmos um país de gente sofrida e humilde, herdeiros da escravidão, em um país de gente feliz. Que triunfaram além do tempo, pós independência, onde esta felicidade não se resume a sustentar as ambições de uma burguesia nativa que com o andar do tempo transformou-se em reacionária. Uma burguesia que é o instrumento daqueles que no passado nossos pais e avós fizeram questão de expulsar os mesmos.
Foi há bem pouco tempo, uma semana atrás, que o Presidente de Angola, esse presidente que aí temos, tido como clarividente, “inteligente” e por aí vai. A chuva de adjetivos que enaltecem o personagem, vindo de seus subordinados só não é maior, porque são finitos os adjetivos elogiativos nos diferentes dicionários da língua portuguesa. Como dizia, foi a bem pouco tempo que o Presidente da República culpou o colonialismo português pela nossa miséria.
Mas uma vez digo: o congresso do MPLA deveria servir para alguma coisa. Onde estão as novas idéias? A ousadia de se construir algo novo em cima do que é velho e caduco, além de tudo aquilo que já nos habituaram? Que é ser complacente com os velhos hábitos da cultura colonial portuguesa. Uso esse texto, essa arma, enfim, a internet, para insurgir-me contra tudo aquilo que vem daquela velha potência imperial ou, simplesmente, o colonialismo português. Eu me nego, a qualquer forma e de qualquer maneira, ver no trabalho doméstico a forma digna de se vencer toda herança colonial. Este só tem como objetivo representar o fracasso de uma nação e um dos instrumentos (componentes) da força de trabalho que num passado sujeitava o modo de produção no sistema colonial e escravocrata que a nação angolana esteve submetida nos quinhentos anos de colonialismo.
Quando uso os termos “modo de produção” e “força de trabalho” a definição aqui usada é precisamente a definição Marxista. E não existe alternativa possível. E é preciso recordar que aquela é o conjunto ( ou a soma) desta com as “relações de produção”.
E mais uma vez, o modo de produção –segundo Marx, ou a interpretação minha extraída do mestre- é a maneira como as classes sociais, num determinado sistema, disputam a propriedade ou a riqueza gerada pela sociedade.
Que disputa digna existirá, no país das pessoas que enriquecem do nada, apadrinhados pelo patrimonialismo, pelo clientelismo, pelo tráfico de influência, pelo amiguismo, no país que dá preferência aos expatriados do que os próprios nativos e que veem nestes a mão de obra barata e escrava a ser humilhada, entre as empregadas domésticas e as princesas ou príncipes da elite angolana?
Esse artigo, como muitos que já escrevi, é o reflexo e a representação desesperada de quem em muitas ocasiões, mesmo estando na diáspora, não se conforma com a maneira ou o jeito com que determinados problemas no país dos mwangolé são encarados, pelo governo, o estado angolano, o MPLA e o atual executivo no poder.
Assim, para pôr membros e cabeça a nossa polêmica, nós somos contra qualquer tipo de regularização, por lei ou não, dos serviços de empregadas domésticas! Nós somos a favor de uma cultura educacional e de ensino que precisamente desestimule esse tipo de atividade. Somos a favor de um tipo de educação que incentive toda –absolutamente toda- uma geração de crianças e adolescente a verem na mesma a única escada para ascenderem na vida e serem pessoas dignas livres de todos os tipos de preconceitos sociais.
Defendemos a ideia de que quem quiser ganhar dinheiro, por mínimo que seja, ou ser alguém na vida, tem que enfrentar quinze anos –no mínimo- de escola de maneira consecutiva e anual. E o alcance desses objetivos –estudar- deve ser responsabilidade de todos, mas primeiro do Estado, segundo da Sociedade e terceiro da família.
Defendemos que quem quiser lavar a louça de sua casa, lavar a roupa e as cuecas do seu marido, varrer a casa e limpar o chão, mesmo sendo médica, advogada ou empresária e estando entre as dez mais rica da África, do país Angola ou do mundo, que o faça ela mesma.
Estamos sendo classistas de mais!? Sim ou Não, precisamos aderir a essa luta. A luta de classe é um fato que ninguém pode rejeitar e achar que estamos livres da mesma. Ela existe quando se proclama no parlamento angolano um suposto direito que incentivará a mão de obra barata e escrava; e que venham mais ainda humilhar a dignidade de nossas mães, irmãs, filhas e esposas. As empregadas domésticas, num país como nosso, a Negra – a “Minha Mãe, Todas as Mães Negras”- elas não só fazem ou farão parte da escala social mais baixa, mas serão tidas e absorvidas como verdadeiras escravas de uma sociedade capitalista cruel, que tem como característica estimular todas as formas de preconceito e, principalmente, o racismo.
Evitar a promulgação daquela lei no Parlamento Angolano é oferecer a mulher angolana um desafio de cidadania e fazer com que ela encare a vida e o progresso que o país precisa de uma outra forma. Ela tem que se convencer que esse progresso só é alcançado com o trabalho intelectual, que exige do espírito humano o despertar para a vida sua, de sua família e de toda a nação. É fazer com que ela aprenda a se preparar intelectualmente e como mulher numa Angola nova, livre de patrões reacionários e escravos. É também dar a responsabilidade a ela, e talvez a maior, de que o desenvolvimento do país – uma Angola desenvolvida, livre de misérias- passa pela intelectualidade dela, pela educação dela, pelo profissionalismo. Em que a mesma é o núcleo da família, disposta e preparada a dar exemplos, a todos: incluindo aos patrões exploradores (a essa burguesia nativa, traidora, hoje reacionária, exploradora, corrupta e usurpadora de glorias) e enterrar de maneira definitiva e para sempre os vícios do colonialismo português.
A aprovação de uma Lei Trabalhista, sobre trabalho doméstico, que regularize a relação empregada e patrões é péssima para uma Angola que precisa de educação massiva para se desenvolver. O esforço na dedicação ao ensino e à educação tem que vir do conhecimento e da cultura de que qualquer trabalho intelectual livra o homem e a mulher da escravidão, de quem quer que seja.
Nelo de Carvalho
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